Por que as mulheres cuidam dos outros, mas não cuidam delas próprias?

As mulheres, historicamente, sempre foram vistas como cuidadoras. Desde a infância, muitas são ensinadas a colocar as necessidades dos outros à frente das suas, seja da família, dos filhos, dos pais, dos parceiros, dos colegas de trabalho ou até dos amigos. E essa atitude de cuidar dos outros acaba se tornando tão natural que, muitas vezes, esquecem de cuidar de si mesmas. Mas por que isso acontece? E quais são as consequências desse comportamento para a saúde, especialmente conforme as mulheres envelhecem?

1. A cultura do cuidar

Culturalmente, espera-se que as mulheres desempenhem o papel de cuidadoras. Desde as brincadeiras com as bonecas, muitas crescem ouvindo que é seu “dever” cuidar dos outros, seja em casa ou no trabalho. Esse papel, embora nobre e importante, também pode ser uma armadilha. Colocar os outros sempre em primeiro lugar acaba gerando um ciclo em que o autocuidado é visto como algo “egoísta”, “supérfluo” e “que pode ser deixado para depois”. No entanto, essa mentalidade pode ser prejudicial tanto física quanto emocionalmente.

2. As demandas da vida moderna

A participação feminina no mercado de trabalho cresceu de forma exponencial nas últimas décadas, mas o trabalho do cuidado continuou majoritariamente nas mãos femininas. Um estudo de Pinquart & Sörensen, de 2006, mostrou que as mulheres dedicam mais horas por semana, mais anos de vida e assumem maior número de tarefas relacionadas ao cuidado quando comparadas aos homens. Muitas mulheres enfrentam uma jornada dupla: são profissionais durante o dia e cuidadoras durante a noite. Elas cuidam da casa, dos filhos e, muitas vezes, também dos pais idosos. Algumas fazem parte da geração-sanduíche e cuidam dos pais e dos filhos pequenos ao mesmo tempo. Diante de tantas demandas, é fácil que o tempo dedicado a si mesmas seja colocado em último lugar. As mulheres acabam então se desgastando e adoecendo.            

3. As consequências do descuido

Com o passar dos anos,a negligência com a própria saúde, pode se manifestar em forma de doenças crônicas, como hipertensão, diabetes, obesidade e depressão. Muitas mulheres só páram para cuidar de si, depois do crescimento dos filhos e falecimento dos pais. Nesse momento, algumas já são idosas e perderam anos de investimento na própria saúde que poderiam direcioná-las para um envelhecimento mais saudável. Se isso aconteceu com você, tenha em mente que nunca é tarde para começar. 

4. O impacto do estresse

O estresse constante é uma das maiores ameaças à saúde das mulheres. Ele afeta o sistema imunológico, aumenta a pressão arterial e interfere no sono. Além disso, muitas mulheres que estão sempre cuidando dos outros não conseguem encontrar tempo para praticar exercícios físicos, manter uma alimentação equilibrada ou até mesmo fazer exames de rotina. O acúmulo de estresse e a falta de autocuidado criam um ciclo vicioso: quanto menos as mulheres cuidam de si, mais difícil é manter a saúde física e mental.

5. Como mudar esse cenário?

Reconhecer o seu valor é o primeiro passo. Cuidar de si mesma não é egoísmo, é uma necessidade. Você não precisa dar conta de tudo e cuidar do outro não é uma missão divina. É um trabalho, muitas vezes não remunerado e pouco valorizado. Um dos principais desafios é quebrar a ideia de que “não há tempo” para cuidar de si. Pequenas mudanças no dia a dia podem fazer a diferença. Os primeiros passos são os mais difíceis. Você pode estar tão cansada que não consegue enxergar outros caminhos. Por isso minha dica, é começar com o descanso. Se puder, tire uns dias de férias, saia da rotina e vá para um lugar onde o celular não funciona. Se não puder, reserve 10 minutos do seu dia para não fazer nada. Nesse tempo, ninguém pode falar com você. Você terá controle total sobre esse momento. Respire, ponha as pernas para cima e pense em uma pequena mudança que pode ser feita na rotina, uma tarefa simples que pode ser feita por outra pessoa. Torne esse momento inegociável, vá ganhando segurança de que as pessoas vão ficar bem sem a sua presença. E no decorrer das semanas vá fazendo ajustes um pouco mais audaciosos.  

6. Cuidar de si mesma é tão importante quanto cuidar dos outros

Ao priorizar sua saúde, as mulheres se tornam mais fortes, equilibradas e resilientes, o que as capacita a continuar ajudando quem amam de forma mais saudável. É preciso carregar sua bateria para cuidar do outro. Você vai precisar de força e disposição física para cuidar. Mas vai precisar também de bem-estar mental para proporcionar um cuidado mais significativo e alegre. Imagino que você não queira apenas garantir o alimento do seu filho, mas queira que ele seja feliz. Também imagino que você não queira apenas trocar a fralda do seu pai, mas auxiliar que ele tenha uma vida digna e satisfatória. Ao dividir melhor as tarefas e ter tempo para descansar, você pode até se divertir em alguns momentos do cuidado. 

Conclusão: Cuidar de si para cuidar dos outros

Cuidar de si não é um luxo ou capricho, é uma parte essencial de uma vida saudável e equilibrada. E ao se priorizar, as mulheres ganham mais disposição, saúde e longevidade, podendo, assim, continuar sendo a base forte de suas famílias e comunidades, mas sem esquecer do seu próprio cuidado e cultivo de hábitos que permitam um envelhecimento mais saudável.

Referências: Pinquart, M., & Sörensen, S. (2006). Gender differences in caregiver stressors, social resources, and health: An updated meta-analysis. The Journals of Gerontology Series B: Psychological. Sciences and Social Sciences, 61, P33–P45. doi:10.1093/geronb/61.1.p33

Caputo J, Pavalko EK, Hardy MA. The long‐term effects of caregiving on women’s health and mortality. Journal of Marriage and Family. 2016 Oct;78(5):1382-98.

Muito obrigada pela atenção e por dedicar seu tempo a essa leitura. Espero ter te ajudado a enxergar novos caminhos. 

Um abraço, Camila Rabelo

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